Chegança Girauense: Com 120 anos, conheça o único folguedo do tipo no agreste alagoano pelo Mestre do grupo

Mestre da cultura popular de Girau do Ponciano fala sobre seu amor pela chegança girauense.

 

Texto de Lu Melo com supervisão de Bertrand Morais

No balançar de um navio, a chegança desembarca no território alagoano, especificamente sendo atracada em Girau do Ponciano, interior de Alagoas. Ali, o movimento cultural conta as desbravadoras histórias de marinheiros e os contos ligados ao seu melhor companheiro: o mar. Mesmo longe do mar, o grupo continua resistindo como o único folguedo do tipo, no agreste alagoano.

As navegações iniciaram em 1905, trazidas de Rio Largo por João Cheiroso e, até hoje, os trajes marcados pelas suas fortes cores e saberes são passados de geração a geração. Para José Miguel da Silva Lima, Mestre da Chegança Girauense, precisamos conduzir os jovens para reconhecer as suas raízes dentro da cultura imersiva do agreste alagoano.

À Revista Alagoana, o Mestre conta sobre sua paixão, apreço e os desafios do reconhecimento do movimento cultural na nova geração.

 

R.A.: Quando começou a sua paixão pela chegança?

Eu comecei a acompanhar os movimentos culturais quando eu tinha 10 anos de idade. Meu irmão e meu pai já participavam e acompanhavam eles. Eu achava lindo, o pessoal ficava brincando, se divertindo e depois fui convidado a participar. Aí comecei me engajando, aprendendo as músicas, a história linda que mexe com o povo. Já atuei como Guarda-Marinho, depois fui o segundo sargento da Chegança, e, hoje em dia, estou à frente da Chegança como mestre. Antes de mim já tinham passado duas pessoas [José Firmino e José Alias] e, atualmente, sou o terceiro da linha de sucessão.

 

R.A.: Quais são suas inspirações dentro da chegança? Elas influenciam em que parte na chegança girauense?

Minha maior inspiração são as nossas qualidades, as nossas tradições e o resgate das raízes para não deixar serem esquecidas. A Chegança passa de geração em geração e assim vou levando nas escolas e mostrando os talentos que nós temos aqui em Girau do Ponciano, como oficinas, e evidenciando o resgate a essa tradição: a verdadeira Chegança girauense. Queremos levar para outros municípios – como Arapiraca e Maceió – a nossa cultura. 

 

R.A.: São 125 anos de história de folguedo. Como é ser o/um dos sucessores de João Cheiroso? Quais são os desafios em assumir e preservar a chegança no agreste alagoano?

O maior desafio é a falta de reconhecimento da cultura na nova geração. Nós tentamos tirá-los das drogas, das telas dos celulares e através dos espaços oferecidos pelas escolas, ensinamos os alunos a nossa cultura. Porque uma parte dos alunos não conhecem as raízes da cultura popular de Alagoas; sempre cobro isso à gestão. Acho que os estudantes também, além das matérias casuais, deveriam aprender sobre o que seriam os folguedos, as histórias de bumba-meu-boi, movimentos culturais que enriquecem o nosso território. Não é fácil estar na linha de frente, nós queremos levá-los ao teatro, para ações culturais e muitos não querem. Mas tentamos tirar esses jovens das ruas e das drogas para que eles possam se empenhar e se engajar nos movimentos culturais.

 

R.A.: Uma diferença interessante do seu grupo é os trajes mais coloridos, algo incomum dentro do folguedo. Isso vem de uma ideia sua ou foi acontecendo ao longo do tempo?

Esses trajes já vêm desde os antigos, quando eu conheci os uniformes deles, desde os meus 10 anos. Foram aqueles mesmos trajes, aquelas mesmas cores, que representam as cheganças. E assim, dando continuidade às cores e o brilho das cheganças, porque geralmente tem cheganças que tem os uniformes diferentes, mas as cantorias são as mesmas, muda, às vezes, algumas estrofes, mas permanece a mesma melodia. E a gente, acompanhando algumas cheganças, é interessante. A gente compartilhar essas tradições culturais, tanto das cheganças como da marujada, é quase a mesma coisa, muda só algumas estrofes. Mas é o mesmo significado. E a gente dá a oportunidade às tradições e aos uniformes, às cores que permanecem da chegança. Sempre foi essa que continuará o som. Ela foi em dois momentos: Desde 1905, foi uma turma, e de 1950 foi outra turma. E assim, dando oportunidade, passando de geração em geração, às nossas tradições culturais.

 

R.A.: A sua chegança tem uma quantidade menor de participantes se comparado com outros grupos do estado, é algo idealizado pelo senhor ou é apenas uma coincidência?

É sempre aquela quantidade de 25 componentes. Sempre que eu conheci e dei continuidade com esses membros. Aí a gente tem essa trajetória, que cada um tem a sua parte individual. Temos no grupo, Mestre Patrão, Contramestre, Capitão-Artilheiro, Almirante, Sargento, Marujo, Mouro, Gajeiro, Pandeirista e entre outros. Aí cada um tem a sua parte. Tem chegança que tem mais, né? Eu acompanho alguns grupos. Mas isso vem desde a minha infância, eu conheci a chegança girauense com essa quantidade.

 

 

R.A.: Por último, qual é o seu recado para as pessoas que pretendem conhecer melhor a chegança?

A nossa chegança tem muito o que mostrar. Está faltando também o incentivo dos gestores. Às vezes a maioria quer contratar banda, gasta uma fortuna e um pequeno gesto não ajuda a chegança. Quando somos contemplados, é pela lei do incentivo do governo federal, que se distribui entre os municípios. Esse ano fui excluído, porque tenho que pagar o IPTU e não recebi a parcela. O dinheiro vem diretamente para os mestres, para os artistas da terra. A gente que mexe com as tradições não é fácil. É qualquer tipo de cultura, tanto ela no artesanato, na música, e assim sucessivamente. Estamos aqui para ajudar, para trabalhar para o bem do nosso folguedo popular, do nosso município.

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