Atualizado: 14 de jun. de 2023
Com apoio do Sebrae e Governo de AL, artesãs pioneiras empreendem e transformam produção artística em fonte de renda
Por Gabriely Castelo e Lícia Souto
A cerca de 124 km da capital alagoana está a belíssima e tão procurada Maragogi, famosa por seu mar azulado e inesquecível, que conquistou os olhos do país inteiro. Enquanto os turistas se encantam com águas deslumbrantes da região, algo maravilhoso surge na zona rural, mais precisamente nos assentamentos agrários de Água Fria, protagonizados por mulheres talentosas e visionárias.
Sob o nome criativo de “Mulheres de Fibra”, artistas estão revolucionando a realidade local através da produção de peças únicas, feitas a partir do tronco da bananeira, algo que nunca tinha sido visto antes. A partir do material, elas moldam cuidadosamente peças que carregam consigo a história e a identidade de cada uma delas. Cada objeto produzido é uma verdadeira obra de arte, resultado de técnicas ancestrais e de um trabalho manual minucioso.
Lúcia Oliveira é presidente da Associação Mulheres de Fibra e ajudou a escrever “A associação começou por uma necessidade, as mulheres trabalhavam na roça, plantando lavouras de agricultura familiar. Nós tivemos a oportunidade de fundar a associação para que a gente pudesse aumentar a nossa renda, já que o trabalho da lavoura é inconstante, não produz todo o tempo e o inverno traz prejuízos. Isso permitiu que muitas mulheres saíssem do campo, do trabalho rural e tivessem outra fonte de renda.”, conta a líder.
No início, uma das maiores dificuldades enfrentadas foi a comercialização do trabalho, porque esse tipo de artesanato não era conhecido na região, e além disso, mesmo tendo recebido treinamentos sobre o manuseio da fibra, elas não sabiam tratar adequadamente ainda o que levava a perda de muitas peças, causando prejuízo.
Ela conta que a partir disso as artesãs começaram a profissionalizar o negócio através de consultorias do Sebrae, a que atribuem o maior avanço na qualidade da produção devido ao conhecimento adquirido e, do apoio de órgãos públicos. O trabalho antes produzido individualmente resultava em diferentes acabamentos para as peças e gerava um impacto nas vendas. Por isso, a união dessas mulheres e a criação da associação, hoje com 10 integrantes, permitiu que o negócio crescesse muito mais rápido e as despesas ficassem menores e mais igualitárias.
Agora até as filhas das artesãs começaram a aprender as técnicas de produção, dando continuidade ao negócio e ao começo de uma tradição. “Esse modelo de negócio desenvolvido mudou bastante a nossa realidade local, principalmente as condições financeiras de cada artesã associada, podemos dar uma vida melhor para os nossos filhos. Esse projeto nos trouxe, inclusive, um crescimento e desenvolvimento pessoal, através de conhecimento que adquirimos em todos os setores, atendimento, tudo.”, explica Lúcia.
A estação mais adequada para a produção é o verão, já que no inverno não é possível secar a fibra. Com avanços constantes, atualmente é possível tingir o material, tornando as peças ainda mais exclusivas e coloridas. Uma artesã compartilha um pouco do processo de produção das peças:
“Primeiramente, cortamos os cachos de bananeira quando estão maduros, focando principalmente no tronco. A partir dele, extraímos camadas para obter fibras mais finas, que serão transformadas nas peças. Enquanto isso, tecemos uma rede no tear e, em seguida, bordamos sobre o tecido anteriormente criado”, esclarece.
Por meio desse processo delicado, as artesãs são capazes de confeccionar uma variedade maior de produtos, desde caminhos de mesa e jogos americanos até bolsas, luminárias e cestas. Elas até se aventuraram em produzir roupas com a matéria prima, que até já foi utilizada em ensaios fotográficos artísticos.
Seus planos para o futuro incluem ter uma loja. Atualmente, possuem um espaço onde produzem e vendem seus produtos, mas desejam expô-los aos turistas para expandir as vendas e, assim, melhorar suas condições de vida. “Também temos como meta vender no exterior, exportar nossos produtos. Nosso sonho é que o nosso artesanato seja reconhecido mundialmente”, destaca.
Sebrae + Alagoas Feita à Mão: parceria colabora com o empreendedorismo do artesanato no estado
O Sebrae tem desempenhado um papel fundamental no impulsionamento do empreendedorismo e do artesanato em Alagoas. O projeto Mulheres de Fibra tem recebido apoio da instituição há muitos anos. O Sebrae foi um dos responsáveis por estabelecer a Associação desse projeto nos assentamentos do município de Maragogi, que inicialmente contava com participantes de diversos deles. Atualmente, as talentosas artesãs desenvolvem seu trabalho dentro do assentamento Água Fria.
Marina Gatto, gestora de Artesanato do Sebrae Alagoas, explica que o Sebrae oferece suporte não apenas para questões de gestão, arte digital e finanças, mas também na promoção do trabalho em equipe. Ela destaca que o local do assentamento antes não possuía sequer energia elétrica, mas graças à articulação realizada pelo Sebrae, foi possível que a luz chegasse às redondezas. Além disso, o Sebrae busca proporcionar acesso ao mercado por meio de rodadas de negócios. “Nós as colocamos em contato direto com o trade turístico, especialmente os hotéis da região norte. Atualmente, elas vendem seus produtos em várias lojas e galerias em todo o Brasil, especialmente nas regiões sul e sudeste”, enfatizou Marina Gatto.
A gestora destacou também que o Sebrae está sempre disposto a apoiar indivíduos, comunidades e até mesmo entidades públicas ou privadas que identificam potencial de trabalho e desejo de desenvolvimento em suas respectivas regiões. O objetivo principal é impulsionar o crescimento dos pequenos negócios e estar prontamente disponível para colaborar nesse processo.
Qualquer artesão que possua habilidades como a leitura e tenha aprendido com sua mãe a fazer crochê, filé, trabalhar com barro ou entalhar madeira, e que esteja interessado em avançar em sua trajetória, pode facilmente buscar o apoio do Sebrae por meio de canais virtuais, como WhatsApp ou redes sociais. Ao entrar em contato, o Sebrae compreenderá suas necessidades e buscará estabelecer parcerias para o desenvolvimento do grupo ou região em questão. A maioria dos serviços oferecidos pelo Sebrae aos artesãos é gratuita e abrange uma variedade de recursos, como consultorias, oficinas e palestras, tanto em formatos presenciais quanto online.
Para Marina, a priorização desse público pelo Sebrae se deve ao reconhecimento de que o artesanato faz parte do patrimônio vivo e do acervo cultural do estado. “É fundamental preservar, desenvolver e transmitir essa forma de arte às próximas gerações, evitando sua perda ao longo do tempo. O Sebrae desempenha um papel significativo na continuidade da cultura alagoana, garantindo que ela permaneça viva e próspera”, finaliza.
O projeto “Alagoas Feita à Mão”, criado em 2015 pela Secretaria de Desenvolvimento Econômico e Turismo (Sedetur), vinculada ao Governo de Alagoas, também tem desempenhado um papel fundamental na potencialização dos talentos artesanais das mais diversas regiões do estado. O programa busca promover e preservar a identidade e as técnicas artesanais locais, estimular a comercialização dos produtos e implementar ações estruturantes que visam melhorar as condições de trabalho e apoiar a comercialização das peças.
Para Anne Ferreira, Gerente de Design e Artesanato da Secretaria de Estado do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços (Sedics/AL),com a participação em eventos locais, nacionais e internacionais, o artesão alagoano está cada vez mais abrindo mercado para sua produção, sendo o artesanato sua maior ou única fonte de renda. “O artesanato alagoano sempre é destaque em feiras e eventos de comercialização, nacional e internacional, em Alagoas o artesanato ainda não é muito consumido por nativos, comparado o consumo do artesanato alagoano em outras localidades, sendo uma venda mais direcionada para turistas”, explica.
A atividade artesanal apresenta-se como fonte de renda para mais de 8,5 milhões de pessoas no Brasil, e movimenta cerca de 28 bilhões. Ainda segundo a gerente, “Alagoas é o segundo estado com mais artesãos cadastrados e beneficiados através do Programa Alagoas Feita à Mão e do Programa Nacional do Artesanato Brasileiro-PAB, com isso, estimamos ser o segundo estado que mais movimenta a economia nacional no segmento artesanal”, explica.
Artesanato movimenta economia em Alagoas
A economia do estado de Alagoas, historicamente voltada para a agricultura, especialmente a produção de cana-de-açúcar, presencia nos últimos anos um crescente avanço do setor da economia criativa. Os artesãos têm desempenhado um papel cada vez mais importante na economia alagoana, e diversos fatores têm contribuído para esse fenômeno, segundo o economista Diego Farias.
De acordo com Farias, um dos principais incentivadores desse crescimento é “a demanda por produtos artesanais únicos e de alta qualidade, em contraste com a produção padronizada. Os consumidores estão cada vez mais valorizando a autenticidade, a individualidade e a história por trás dos produtos que compram”.
Outro fator importante e de grande valia para as produtoras tem sido o o papel do comércio eletrônico e das redes sociais na promoção e venda dos produtos artesanais alagoanos. As plataformas online permitem que as artesãs alcancem uma ampla base de clientes em todo o mundo, possibilitando a expansão de seus negócios para além das fronteiras locais.
“A comercialização do artesanato tem se diversificado e adaptado às mudanças do cenário econômico, oferecendo aos artesãos diversas opções para alcançar os consumidores e promover suas criações de maneiras inovadoras”, complementa.