Criadora de cineclubes e projetos culturais, artista fala sobre sua vivência e a força do cinema como ferramenta de transformação social
Texto de Esmeralda Donato com supervisão de Bertrand Morais
O cinema nacional é feito de histórias que atravessam o tempo, os territórios e as subjetividades de um país inteiro. No mês em que celebramos o Dia do Cinema Brasileiro, é impossível não reconhecer a força de quem constrói, com poucos recursos e muita paixão, as imagens que narram o Brasil plural. O audiovisual segue sendo uma das expressões culturais mais potentes quando o assunto é identidade, memória e transformação social.
É nesse cenário que se destaca Dayane Teles. Formada em Comunicação Social e com especialização em Metodologia do Ensino das Artes, a produtora cultural, diretora de cinema, atriz e educadora arapiraquense tem um trabalho enraizado no agreste alagoano. Sua atuação em cineclubes, formações e projetos como o Cine na Rede reforça o poder do cinema como ferramenta de memória, afeto e transformação.
Em entrevista concedida à Revista Alagoana, ela compartilha sua trajetória artística, comenta os desafios e conquistas da cena cultural arapiraquense e reflete sobre o futuro do cinema brasileiro. Uma conversa potente com quem transforma realidade em roteiro e território em tela. Confira:
R.A.: Como é a sua vivência enquanto mulher arapiraquense e multiartista?
Dayane: Então, tudo foi fluindo, sabe? Desde pequena eu já gostava de atuar, de cantar, de ver filmes. Essa minha multifacetação artística foi surgindo com o tempo, de forma natural. Primeiro veio o circo, depois o teatro. Mais tarde, me envolvi com cineclubes na cidade, e, de repente, já estava gravando filmes. Foi um processo contínuo de descobertas e oportunidades que foram aparecendo ao longo da minha trajetória.
R.A.: Você acredita que Arapiraca é um terreno fértil para o cinema? Por quê?
Dayane: Com certeza. A gente descobriu, por meio de cursos e pesquisas, que Arapiraca já fazia cinema lá nos anos 60 e 70. Com o tempo, isso foi se fortalecendo. Os cineclubes têm um papel fundamental nesse crescimento da cena audiovisual local. E depois veio o NAVI (Núcleo do Audiovisual de Arapiraca), que nasceu dos pontos de cultura e tem contribuído muito com formação, profissionalização e produção de filmes em parceria. O NAVI impulsionou muita gente a fazer cinema aqui.
R.A.: Como é sua experiência ao costurar histórias do Agreste, seja atuando ou dirigindo?
Dayane: É uma delícia. A gente vai descobrindo essas histórias através de leitura, pesquisa, ou mesmo quando sou convidada a participar de uma produção. Me encanta conhecer essas narrativas espalhadas por todo o Agreste. E quando estou na direção, é ainda mais especial. Dirigir, para mim, é contar histórias — e acho que todo cineasta gosta disso. Seja como atriz ou diretora, mergulhar nessas histórias é riquíssimo.
R.A.: Como você avalia os processos e as mostras de cinema na cidade? Podemos considerar Arapiraca um epicentro do audiovisual em Alagoas?
Dayane: Eu considero, sim. Muita coisa está acontecendo por aqui. Não só cursos, mas oficinas, gravações constantes, praticamente toda semana tem um filme sendo rodado, graças aos editais. A força do cinema aqui é antiga, mas agora está mais visível. Temos vários cineclubes ativos, filmes circulando, produções em série… Inclusive, recentemente foi gravada uma série aqui que durou quase 20 dias de filmagens. Além disso, temos novos cineastas chegando, pessoas se interessando por outras áreas do audiovisual, como direção de arte, som, montagem. Tudo isso mostra que a cena só cresce. Arapiraca tem cinema, tem cineasta e tem público.
R.A.: Quais são suas expectativas para o futuro do cinema brasileiro? E como você gostaria de ser lembrada?
Dayane: O cinema brasileiro só tem crescido, desde os primórdios até hoje. Temos grandes atores, atrizes, diretores. Estamos ganhando visibilidade fora do país, não só nos Estados Unidos, mas em muitos lugares. Sobre como quero ser lembrada… Olha, não tenho ambições gigantes. Quero que meus filmes sejam lembrados, claro, que meu nome esteja ali, bonitinho. Mas, acima de tudo, quero ser lembrada por contar grandes histórias, por tocar pelo menos uma pessoa. Se eu conseguir emocionar alguém com o que produzi, já fico feliz. Isso já me basta.
R.A.: Queríamos abrir um espaço para você deixar uma mensagem para quem deseja se inserir no audiovisual, principalmente para o pessoal de Alagoas.
Dayane: Comece. Do jeito que for. Dentro do set, qualquer função é importante — seja segurando um guarda-sol, ajudando na produção, carregando água. O essencial é estar presente, observar, aprender com os profissionais que já estão na área. E veja muitos filmes! Principalmente os brasileiros, e mais ainda os alagoanos. A gente aprende muito assistindo.
Além disso, aproveitem os cursos, oficinas e formações que estão sendo oferecidas, muitas vezes gratuitamente, pelas produtoras daqui. As oportunidades estão aí. Basta a gente se movimentar, sair de casa, ocupar os espaços e construir juntos essa cena audiovisual alagoana, que está crescendo cada vez mais.