Com recursos próprio e histórias urgente, cineasta aposta na sensibilidade e na autenticidade para transformar o audiovisual independente
Texto de Esmeralda Donato com supervisão de Bertrand Morais
O cinema independente tem se consolidado como uma das principais ferramentas de denúncia, representatividade e transformação social no Brasil. Quando o olhar de quem dirige está diretamente conectado à vivência que se propõe a retratar, o resultado é um cinema mais íntimo, mais humano e socialmente potente. Nesse cenário, surgem obras capazes de provocar não apenas emoção, mas também reflexão.
Entre os temas mais urgentes trazidos por essas produções, a diversidade sexual e de gênero ocupa um espaço cada vez mais necessário e relevante. Filmes que abordam a vivência LGBTQIAPN+ com sensibilidade e profundidade vêm ganhando atenção, abrindo caminho para novas narrativas e novos autores. O filme Amor é Amor insere-se nesse movimento ao tratar de afetos, identidades e preconceitos a partir da trajetória de um jovem gay que deixa o interior em busca de possibilidades na capital.
Idealizador e diretor de Amor é Amor, Matheus Cabral, iniciou sua trajetória ainda na adolescência. Aos 17 anos, fundou a Tio Coruja Produções, empresa dedicada à animação de festas e eventos com personagens e mascotes. Desde então, constrói uma trajetória marcada pela criatividade, independência e pela vontade de contar histórias que dialoguem com realidades muitas vezes invisibilizadas.
O filme está em processo de estreia, com previsão para o mês de junho — em alusão ao Mês do Orgulho LGBTQIAPN+. A equipe ainda avalia possibilidades de local, e entre os espaços cogitados está o Teatro Homerinho.
A Revista Alagoana conversou com Matheus sobre os bastidores da produção, o processo criativo e os desafios — e responsabilidades — de contar uma história marcada por tantas camadas sociais e emocionais. Confira:
R.A: Como o audiovisual entrou na sua vida? Foi algo que sempre te atraiu ou surgiu aos poucos?
Matheus: Desde criança o audiovisual faz parte de mim. Sempre fui apaixonado por novelas — me via nelas, me imaginava atuando. Com o tempo, essa paixão foi crescendo, virei pesquisador das artes. Mesmo não tendo formação em cinema, mas sim em artes dramáticas, nunca me vi fazendo outra coisa. Sempre sonhei em atuar, dirigir, escrever minhas próprias histórias.
R.A: Como surgiu a ideia para o roteiro de Amor é Amor? Teve alguma experiência pessoal envolvida?
Matheus: Veio da necessidade de não ficar parado e do desejo de atuar. Acredito que o ator precisa ser produtor de si mesmo. Amor é Amor nasceu dessa vontade, mas também da realidade — da homofobia, do preconceito, da luta que muitos vivem. Tem algo pessoal meu no Altair, mas também é sobre dar voz a tantas histórias reais que ainda não foram contadas.
R.A: O que te levou a contar essa história sob o ponto de vista do personagem Altair?
Matheus: Altair é um jovem do interior que vai pra capital em busca de oportunidades, como muitos. Essa escolha também veio da produção independente — não dava pra mostrar uma grande empresa, mas dava pra mostrar o caminho de alguém que parte do pouco, com força e coragem. A trajetória dele é sobre isso: amor, enfrentamento e transformação.
R.A: Como foi dirigir um filme com uma carga emocional tão intensa? Alguma cena te marcou?
Matheus: Foi muito forte. Duas cenas me marcaram muito: a do estupro e a briga entre Altair e o pai de Maurício. Trabalhei com muito cuidado com os atores, criamos um espaço seguro pra que tudo fosse ensaiado com respeito. Ver a entrega de todo mundo foi emocionante. Ali eu vi que o filme tava vivo.
R.A: A geografia do filme — do interior à capital — tem um peso simbólico. Como isso influenciou a obra?
Matheus: Com certeza. A gente começa em São Lourenço, cidade fictícia, mas filmamos tudo aqui mesmo, em Maceió. Mostrar minha cidade, com atores alagoanos, foi algo muito especial. As paisagens, as casas, tudo ajudou a construir esse contraste entre o que se deixa pra trás e o que se encontra pela frente.
R.A: Como foi construir Altair e Maurício? Houve alguma dificuldade em dar vida a esses personagens?
Matheus: Eu costumo conversar comigo mesmo pra criar os personagens — me questiono, sinto o que eles sentem. Altair é introspectivo, vem de uma realidade difícil e guarda tudo para si. Maurício é mais aberto, fala mais, tem outra vivência. Trazer essa diferença foi um desafio, mas também muito enriquecedor. Mesmo sem viver tudo o que eles vivem, eu me conecto com suas emoções.
R.A: Qual é o papel do audiovisual na sua forma de se expressar e provocar reflexão?
Matheus: É um espelho. O audiovisual me permite contar histórias, mas também criar empatia. Muitos jovens LGBT vão se ver nesse filme, vão se reconhecer. Ainda há um espaço grande pra essas vozes, e eu quero ajudar a preencher esse vazio com narrativas reais, sinceras e representativas.
R.A: Pra finalizar, o que mais te encanta e o que mais te desafia nesse processo de transformar ideias em imagens?
Matheus: O que mais me encanta é ver uma ideia sair do papel e se tornar realidade — como um filho nascendo. É emocionante ver as pessoas se reconhecendo na tela. O maior desafio é fazer tudo de forma independente, mas também é o que mais me orgulha. Recebi mensagens incríveis, como da atriz Débora Evelyn, concorri à um premio e embora não tenha vencido só de estar concorrendo já foi muito gratificante. É só o começo.
Ficha Técnica
Criado e escrito por: @matheuscabralreal
Direção geral: Matheus Cabral
Elenco: Matheus Cabral, Paulo Marinho, Rita Lins, Willy Santos, Emilly Valentim, Saulo Porfirio, Carlos Melo, Diego Oliveira, Clara Santos, Sara Isabelly, Lucas Cabral, Luiz Carlos Cabral, Anna Júlia Bertho, Helena Gomes, Nathália Gomes, Sofia Rodrigues, Davi Henrique, David Gomes, Yane Farias, Maysa Xavier, Gabriel Torquarto, Samyra Albuquerque
Fotografia: Victor Farias