Entre amores líquidos e corações em rebote

 

Vivemos tempos em que até o amor parece ter prazo de validade.

Na pressa em não sentir, em não perder tempo com o vazio, multiplicam-se os
relacionamentos rebote — esses encontros apressados que surgem logo após o fim de
uma história, como se o coração pudesse ser trocado de parceiro sem antes aprender a
bater no silêncio.

O filósofo Zygmunt Bauman, chamaria isso de modernidade líquida: um tempo em que
tudo escorre entre os dedos, inclusive os sentimentos.
Nossos vínculos já não se constroem com cimento, mas com vapor — e basta uma brisa
de incerteza para que se desfaçam.

O relacionamento rebote é o espelho emocional dessa liquidez.
Ele nasce do medo do vazio, da dificuldade de estar só, da urgência em preencher o
espaço que o outro deixou.
Não é amor — é anestesia.
É como pôr um curativo sobre uma ferida ainda aberta, que disfarça a aparência, enquanto
sangra em sua essência.
É uma tentativa de se sentir vivo, mesmo que seja por meio de outra ilusão.

Na modernidade líquida, as relações se tornaram experiências de consumo:
usa-se, desgasta-se, substitui-se.
Não há tempo para o luto, nem para o autoconhecimento.
O “novo” parece curar, mas na verdade só adia o encontro consigo mesmo.
E sem esse encontro, tão necessário, nenhum amor resiste — nem o próximo, nem o
último.

Talvez o verdadeiro gesto de coragem, hoje, seja ficar só por um tempo.
Tempo esse pra pensar, arrumar as emoções, aceitar o silêncio, escutar o que restou,
deixar o coração reaprender o próprio ritmo.
Porque o amor maduro — aquele que não é rebote, nem fuga — nasce da consciência de
quem já se viu inteiro na solidão.

No fim das contas, amar em tempos líquidos é um ato de resistência.
É recusar o descartável e escolher o duradouro.
É entender que o vazio não é falta — é espaço.
E só quem sabe habitar o próprio espaço pode, de fato, partilhá-lo com alguém.

Sobre o autor e colunista

Luís Laércio Gerônimo, é natural de Pão de Açúcar-AL, graduado em Filosofia pela Universidade Federal de Sergipe, possui diversas pós-graduação na área das ciências humanas, como Filosofia, história do Brasil, Teologia e Gestão Pública. É mestrando em Educação pela Universidade Autónoma Assunção no Paraguai.

É escritor, com 02 livros publicados: “Meus devaneios” (2023) e Jaciobá Origens (2024), onde narra a genesis do município de Pão de Açúcar-AL.

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