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Jornada das juventudes resgata vez, voz e lugar na cultura popular alagoana

Público intergeracional diverso reuniu-se em Santana do Ipanema, entre os dias 08 a 10 de setembro.

 

Texto de Bertrand Morais

“O evento em si me fez lembrar muito de onde eu vim e o que sou, fez-me lembrar da história/romance dos meus pais e início de minha existência” descreve o participante e morador de Palmeira dos Índios, Lucas Barbosa, 31 anos, e segue em suas lembranças “quando no evento foi falado do reisado, me remonta a apresentação de reisado em setembro de 1989, no sítio Morro Vermelho, município de Iati- PE, que meus pais se viram pela primeira vez, e, após 6 meses, se casaram em 18 de fevereiro de 1990. Formando uma família em um sítio próximo dali com três filhos e, até hoje, eles moram lá”, conclui.

 Este é apenas um dos exemplos em palavras, que a I Jornada das Juventudes da Cultura Alagoana, uma realização da Focuarte e Prefeitura de Santana do Ipanema, causa de impacto em seus participantes quando aproxima as práticas culturais de forma intergeracional. Entre os dias 08 e 10 de setembro, atividades internas e externas tomaram conta da cidade do médio sertão alagoano. A Revista Alagoana esteve presente na cobertura.

Para quem é da cidade que sediou o evento, como Henry Cavalcante, 18 anos, foi incrível e superou expectativas, pois em sua opinião “não se vê mais movimentos artísticos e culturais, mas quando é montado um evento cultural aberto à comunidade santanense e de cidades dos arredores (…), abrimos as portas para conhecer novas formas de cultura, costumes e tradições”.

 Justamente o que ocorreu. Representantes de aproximadamente 30 municípios alagoanos, com idades variando entre 14 a 85 anos, estiveram presentes.

Eunia Lima, moradora de Maceió, foi a primeira pessoa a chegar ao ponto de encontro do ônibus cedido pela prefeitura do Pilar, que a trouxe e demais participantes da região metropolitana. A antecedência de mais de uma hora antes do previsto parece ter valido a pena, quando de volta pra casa comentou:

 “Minha experiência foi simplesmente uma ascensão divina. Emocionei-me com o toré, emocionei-me com as histórias de vida e aprendi que ainda temos muito que fazer por nossa cultura. Só gratidão a Focuarte por essa experiência”, ressalta.

 A primeira noite do evento foi marcada por algumas formalidades e momentos marcantes, como na fala da indígena xucuru-cariri, Jaracinã Silva, que destacou que “antes do Brasil da coroa, já existia o Brasil do cocar”, sendo fortemente ovacionada e levando emoção ao público, quando louvou sua ancestralidade ao lado de um parente, com canto que durou profundos minutos de reflexão. Na sequência, outro destaque foi a cerimônia de diplomação que certificou a Artesã Goretti Brandão e o Contra-Mestre de Guerreiro Rafael Oliveira, como mestra e mestre, em seus respectivos fazeres e territórios. Aquela em Santana do Ipanema/AL e este em Viçosa/AL.

Mestre Rafael, 27 anos, devidamente diplomado, observou que desde a sua infância que segue no meio cultural, e completa que “já adulto represento este segmento artístico-cultural [guerreiro alagoano] no Conselho Estadual de Juventude, representando a FOCUARTE, e agora será uma grande responsabilidade dar prosseguimento daqui pra frente como mestre”.

No sábado, dia 09, a programação começou cedo com a mesa “Juventude tem vez, voz e lugar”, que contou com a participação do Mestre de reisado da cidade de Moita Bonita/SE, José Roberto, 30 anos; o muralista da cidade de Santa Cruz do Capibaribe/PE, Eduardo Santos, 24 anos; o brincante e professor da cidade de Matriz de Camaragibe/AL, Bruno Duarte; além do Mestre Rafael de Viçosa/AL. Na ocasião, certamente, o que mais marcou foi a animação generalizada, causada pelo professor Bruno, que vestiu-se de Jaraguá e puxou entoadas do público, e de forma enfática, disse “utilizem o seu poder nas suas comunidades e provoquem o poder público a necessidade de investir nos figurinos (…), porque a nossa proposta é não deixar as brincadeiras populares morrerem”.

Na sequência, deram-se início as oficinas de Guerreiro por Mestre Edivar e Elias; Taieira por Mestra Ana Paula; Coco de Roda por Mestre Laércio; Papietagem por Mestra Goretti e Contação de História por Meire Deise. A cultura popular se manifestou em sua mais autêntica forma, contagiando a todos. Logo após, foi a hora da divisão de grupos para seguirem para as visitas nas comunidades rurais de Santana do Ipanema, no período da tarde.

Para Ítalo Maciel, 16 anos, morador de Palestina/AL, a I Jornada das Juventudes foi algo muito proveitoso, pois “tive a chance de conhecer novas e incríveis pessoas, aprendi algumas danças diferentes, experimentei novas comidas, ouvi antigas e curiosas histórias, vivenciei momentos incríveis, participei de oficinas maravilhosas (…)” descreve.

A dinâmica das visitas se consistiu por escuta ativa, através de abordagens para conversas com moradores e mapear fazeres culturais ainda existentes na respectiva comunidade. Devidamente registrados à mão, as descobertas foram compartilhadas numa roda de conversa, no dia seguinte, para gestores e participantes. Houveram algumas preocupações também, tais como: a ausência de uma apresentação individual dos mais de 200 participantes e o destino desconhecido por todos para as sobras de alimentos, oriundos das refeições distribuídas gratuitamente para todo mundo. As sobras foram entregues a donos de animais como porcos e as marmitas intactas foram entregues a comunidades carentes. De forma geral, o contentamento foi o predominante.

“Inesquecível, em sua essência, a comunhão mística da cultura popular (…) coração pulsante de viver, pela primeira vez, tanto amor em encontro com as tradições do nosso eterno povo guerreiro alagoano (…). A gente de Santana sente saudade da fervorosa festa que recebemos com todo carinho!” desabafa Juliana Pereira, 37 anos, participante e moradora da cidade sediante.

A despedida, no dia 10, foi marcada pelas trocas dos participantes, sobre vivências diárias em suas localidades e pontuais no evento. Mas, certamente o que mais marcou o encerramento das atividades, foi a surpresa na fala de Wanyo do Pife que emocionou a todos, ao entregar o pífano de seu pai, Mestre Bia, patrimônio vivo de Alagoas, ao diretor-presidente da FOCUARTE, João Lemos, que prometeu preservá-lo- no acervo da Federação.

O multiartista e produtor cultural, Dilton Peixoto, da Barra de São Miguel/AL, parece fechar em tom poético, o que foi viver “o intercâmbio cultural que foi digno de uma infinita riqueza cultural vinda desde os nossos ancestrais – povos originários – até os fazedores de hoje, e todos que lá se fizeram presente com suas expressões artísticas cheias de energia que saíam das pisadas, dos cantos, das danças, dos olhares e das palavras que mostraram e falaram por uma só voz: VIVA A CULTURA ALAGOANA QUE VIVE E SALVA VIDAS!”.

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