Texto por Bertrand Morais
Oh senhores convidados
Quero que me dê licença
Pra falar dessa taieira
Com toda nossa decência
Arilelê, arilelê, arilelê
Oh mãe de Deus.
No mês que celebra-se as manifestações culturais e suas tradições; Alagoas como o segundo menor estado territorial do país, apresenta uma das maiores – em quantidade e práticas – riquezas em uma nação: a cultura nos costumes de seu povo. Por aqui, somos em maior número de folguedos, e um deles, apesar de beirar à sua quase extinção, recentemente conseguiu uma vitória para seguir resistindo.
Estamos falando das Taieiras Nair da Bertina, da qual sua mestra representa-a com a força que um título de Patrimônio Vivo de Alagoas simboliza. Por isso, a matéria de capa da Revista Alagoana no mês de agosto é sobre Ana Paula Rocha Lins.
Mestra Ana Paula à direita, no comando de suas taieiras em apresentação recente, no Museu Théo Brandão. Foto: Bertrand Morais.
A merecida bonança veio após anos de luta por reconhecimento oficial e, claro, exercício de muito amor no ofício de transmitir saberes populares por muitos anos. Apesar das únicas taieiras de Alagoas terem origem no estado vizinho, Sergipe, ao chegar em nossa região sul, a tradição tem se mantida e repassada adiante, sendo, Mestra Ana Paula fruto desse importante ciclo sob influência da senhora Maria da Conceição Wanderley.
Envolvida no respectivo folguedo por mais de vinte anos, tendo este uma ligação direta com a cultura africana no Brasil; em Alagoas, passou boa parte desse período sob apagamento histórico, característica marcante de um país embebecido num racismo estrutural. Em maio do ano passado, o jornalista que vos escreve, esteve na casa da mestra e pôde ouvi-la sobre as dificuldades que tivera enfrentado. O desemprego e dívidas aumentavam, exceto sua motivação em seguir em frente com as Taieiras.
Entretanto, entre algumas iniciativas que efetivassem a política pública de RPV-AL (Registro de Patrimônio Vivo) salvaguardando a mestra Ana Paula e seus saberes, foi o Fórum da Cultura Popular e do Artesanato Alagoano – FOCUARTE, o qual abraçou sua causa, assim como vem fazendo por outros mestres espalhados por Alagoas. A peça abaixo criada pela própria mestra, expressa bem seu sentimento de gratidão por este coletivo:
Indo eu pelo caminho
Com este meu caminhar
É um canto de beleza
Porque eu já sei cantar
Oh meus senhores
Queiram desculpar
O Focuarte está em primeiro lugar
Neste lugar.
Após essa conquista coletiva, a qual também teve apoio da atual gestão de São Miguel dos Campos, cidade onde nasceu e reside mestra Ana Paula e sua identidade cultural, os planos são muitos de uma agora, representante única de Patrimônio Vivo estadual no município. O primeiro deles “a continuidade das minhas taieiras com minhas idosas” ela garante e completa “quero reativar o pastoril Mensageiros Miguelenses e montar um grupo de Taieiras mirim”.
Durante todo o mês de agosto, Mestra Ana Paula teve uma agenda cheia após a divulgação do mencionado fato acima. Entre os eventos, apresentações do Folguedos de Agosto no Museu Théo Brandão e na 1ª Conferência Formativa da Região do Alto Sertão, em Delmiro Gouveia, ambas realizações do Focuarte com parcerias, e claro, a cerimônia de diplomação da mesma, no Museu da Imagem e do Som – MISA.
Mestra Ana Paula se posiciona, orgulhosamente, ao lado da bandeira do Focuarte, em evento no último fim de semana do mês, na cidade de Delmiro Gouveia. Foto: Bertrand Morais.
A Revista Alagoana torce para que o devido reconhecimento permaneça fincado no respeito às tradições e à ancestralidade da mestra Ana Paula. E que outras manifestações culturais tão importantes quanto, recebam seus devidos compromissos de salvaguarda. Viva as Taieiras! Viva Mestra Ana Paula! Viva a Cultura Popular!